sexta-feira, 6 de agosto de 2021

Último apeadeiro

A notícia veio no último jornal local (1Jul2021), sob o título “na mão de Deus”:

“Faleceu, no Oiteirinho, Manuel Ferro Portugal, com 66 anos de idade, casado com Maria Antonieta Mendes. Era pai de Adriano  e de Celina Portugal.”

Assim que li o nome da minha terra natal, os olhos foram direitos à foto inserida no texto. De imediato assaltou-me a ideia de que poderia ser ele. Não queria acreditar… quem sabe? o jornal poderia ter sido induzido em erro! por vezes as fontes enganam-se! Mas o sorriso era único e inconfundível! Só poderia ser ele! o “Ferrinhos ” (alcunha que herdou do pai).

Conheci-o na adolescência… um amigo fiel e leal desde a primeira hora.

Naquela época, eu, que tinha acabado de sair do Seminário, iniciava a aprendizagem duma nova vida; dava os primeiros passos em liberdade, sem a protecção da instituição que me abrigara até ao segundo período do sexto ano lectivo; foi muito importante ter um amigo como ele !

Vêm-me à memória os bailes, as idas à cidade tomar café (na aldeia ainda não havia este “pequeno luxo”), a festa do povo, os discos da música ligeira francesa (Adamo, Michel Polnareff, etc.) trazidos de Paris pelo pai.

Desde então, os encontros foram esporádicos, contudo o vínculo afectivo manteve-se sempre  intacto.

Vivia tranquilo e convicto de que a vida dos amigos é eterna.

Até que surgiu a notícia. Que tristeza, a perda do Manuel Portugal (era assim que eu o tratava, porque percebi que ele não gostava da alcunha!).

Viria a casar com a prima Hernanda.

Viviam-se tempos difíceis, falta de oferta de trabalho. Por isso, e à semelhança da maioria dos jovens naquela época, o Manuel emigrou para o centro da Europa, seguindo as pisadas do pai. Ao fim de algumas décadas regressou definitivamente à aldeia que o viu nascer! E lá se manteve o resto da vida.

Como foi possível a sua partida? Tão novo! Custa acreditar que chegou a sua hora! mas… é a verdade da vida! o reconhecimento de que é uma simples passagem!

Lembrei-me do Poeta: “todos somos passageiros num comboio de alta velocidade…

O Manuel saiu no último apeadeiro; imagino, a sorrir!

Nós prosseguimos viagem contagiados pelo inesquecível sorriso ... dia após dia, hora após hora, minuto após minuto! até ao momento em que o Maquinista tire à sorte para decidir a quem caberá a saída no próximo apeadeiro!