segunda-feira, 25 de julho de 2011

Maria Lúcia Lepecki

Morreu Maria Lúcia Lepecki - diz o jornal Público de hoje.

A professora e ensaísta brasileira, radicada em Portugal, faleceu ontem, em Lisboa, aos 71 anos, vítima de cancro. A notícia foi divulgada pelo escritor Baptista Bastos, que classificou Lepecki como “uma ensaísta notabilíssima e uma defensora da cultura portuguesa”.
Professora catedrática aposentada da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa… ao longo da sua vida colaborou em vários jornais e revistas, tanto em Portugal como no seu país natal, nomeadamente a Colóquio Letras e o suplemento literário do Estado de S. Paulo.
A crónica que, sob o título A vida íntima das palavras assinava na revista Super interessante, constituía um belo e raro momento de sabedoria, com que mensalmente nos brindava. Em sua homenagem selecciono um pedaço da crónica Que palavra? (saída em Março de 2011):

“Se os objectos a contemplar não provêm da concretude que nos rodeia – e isso inclui do sofá da sala ao quadro de Rafael –, se não provêm daquilo que a visão nos mostra, o tacto nos define, o olfacto nos classifica, de onde provirão eles? De um único sítio: do mundo das palavras. Só elas nos podem ensinar a ver Rafael, a apreciar uma mesa Chippendale, a discernir a dramática humanidade de O Pensador de Rodin. Deve perguntar-se se quaisquer palavras cumprem esta função. A resposta é negativa, como qualquer dos meus leitores amadurecido nas lides da comunicação artística já percebeu. Uma única palavra pode transmutar o objecto físico – quadro de Rafael, mesa de Chippendale – em qualquer coisa digna de contemplação no espaço quase sagrado da mente do “homem bom”. Esta palavra é a literária, pela sua capacidade de dizer para além do dito, de mostrar para além do visto, de suscitar à sua volta aquele jogo de sombras e luzes que define, antes de qualquer outra coisa, a natureza misteriosa, por isso mesmo divina, do verbo que incarna em cada um de nós quando trazemos do mundo para a mente aquilo que, provocando meditação, garante a todos e a cada um a realização plena da sua humana natureza.”
Até sempre, MLL!

8 comentários:

  1. Apenas a conheci de um programa antigo da televisão, em que ela participava e gostei imenso da sua forma de comunicar e da sua simpatia.
    Era uma grande Senhora.

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  2. Foi professora do meu marido...mais uma perda.
    Bjs

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  3. Infelizmente para mim não conheci. Obrigada pela partilha deste texto que assim me mostrou um pouco dessa Senhora.
    Um abraço

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  4. Um excerto sublime! A palavra literária tem o dom de mostrar o que os olhos, por vezes, não vêem mas que os sentidos captam.

    Bjos

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  5. Mais uma perda irreparável no mundo das letras. Li vários artigos de MLL e vi-a várias vezes na televisão. Admirável pela eloquência, pela sapiência, pelo pensamento.

    Bem-hajas pelo post que lhe dedicas.

    Beijinho

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  6. Reconheço-lhe muito mérito...eu que sou uma apenas uma aprendiz ...mais nada...o que ela escreve é muito erudito... muito complexo...para compreendê-la é necessária muita concentração...experiência e preparação...

    Quando não se pode utilizar os nossos sentidos socorre-mo-nos das palavras...

    Grata pelo comentário!!!

    Beijo grande

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  7. Petrus,
    obrigada por esta partilha!

    p.s. Petrus, desculpa a ousadia mas tenho um desafio para ti no meu blogue, compreendo se não for possivel.
    Beijinho

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  8. Uma homenagem linda! Sensível. Merecida. Maria Lúcia Lepecki, grande escritora e ensaísta, foi uma grande Professora, segundo palavras de seus antigos alunos.
    Há quem a denomine 'uma das últimas grandes comunicadoras da Universidade portuguesa.' Concordo!

    Uma grande estudiosa da obra de Camilo! Um autor quase esquecido dos portugueses :(
    A última grande 'redescoberta' dos franceses, depois da passagem do filme de Raúl Ruiz, 'Les Mystères de Lisbonne'.

    Camilo Castelo Branco esteve entre os autores mais vendidos do último fim-de-semana em França. Camilo aparecia na banca dos livros mais vendidos da Fnac Forum, Paris, ao lado das edições francesas de 'O Cemitério de Praga, de Umberto Eco, 'O Homem que Gostava de Cães', de Leonardo Padura ou de 'Histoire D'Ici Et D'Ailleurs', de Luis Sepúlveda.

    Maria Lúcia Lepecki, uma das maiores críticas do Acordo Ortográfico, tomou posição abertamente contra!

    Uma perda irreparável para a cultura e literatura portuguesa.

    Votos de excelentes férias!
    Um beijo

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